Anuário de Segurança da América Latina: principais números da criminalidade e ameaças à segurança

O relatório destaca que a violência e o crime organizado na região não são problemas recentes, mas resultado de raízes históricas e estruturais profundas que favoreceram a consolidação de organizações criminosas.

Essas organizações evoluíram e se adaptaram, tornando-se protagonistas que transformam a violência e a integram à economia criminal, gerando um ambiente de insegurança crônica que afeta tanto a população quanto o desenvolvimento econômico e social dos países latino-americanos.

Panorama geral

● A América Latina e o Caribe concentram 33% dos homicídios do mundo, mesmo representando menos de 10% da população global.

● O crime organizado evoluiu para estruturas mais descentralizadas e transnacionais, envolvendo-se com narcotráfico, tráfico de armas, tráfico de pessoas, extorsão, sequestros e lavagem de dinheiro.

● A economia ilícita faz parte integral de muitas economias nacionais e locais, consolidando o poder social e econômico dos grupos criminosos.

● A percepção de insegurança é alta e afeta tanto a população quanto as empresas, que investem cada vez mais em medidas de proteção.

■ Brasil

O Brasil enfrenta um cenário de segurança extremamente complexo, marcado pela persistência de altos índices de violência e pela consolidação de poderosas organizações criminosas. Apesar de reduções modestas nas taxas de homicídio nos últimos anos, o país ainda figura entre os mais violentos do mundo, abrigando 17 das 50 cidades mais perigosas do planeta. O crime organizado, liderado por grupos como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), diversificou suas atividades, dominando não apenas o narcotráfico, mas também o tráfico de armas, a mineração ilegal e o controle de territórios urbanos e rurais.

Apesar dos esforços estatais, como a militarização da segurança pública e a melhora na coordenação policial em alguns estados, o Brasil enfrenta grandes desafios estruturais: um sistema penitenciário superlotado e transformado em centro de operações criminosas, uma percepção de insegurança que não diminui entre a população e o crescimento acelerado de crimes cibernéticos.

■ Contexto geral de segurança

● O Brasil ocupa a 131ª posição entre 163 países no Índice Global da Paz 2024, estando entre os países com maiores desafios de segurança na América Latina.

● 17 das 50 cidades mais perigosas do mundo estão no Brasil, segundo a World Population Review, o que evidencia um ambiente de insegurança crônica que afeta tanto a população quanto organizações empresariais.

● O Brasil é o quarto país da América Latina com maior criminalidade organizada, segundo o Global Organized Crime Index 2023, atrás apenas de Colômbia, México e Paraguai.

■ Criminalidade: tipologias e tendências

● Homicídios: Em 2024, o Brasil registrou 38.075 homicídios, uma queda de 6% em relação a 2023, sendo um dos anos mais seguros desde 2011. Em 2023, foram 45.474 assassinatos, com uma taxa de 21,1 mortes por 100 mil habitantes — a mais baixa em 11 anos, embora ainda esteja entre as mais altas do mundo.

● Desigualdades regionais: São Paulo apresenta taxa baixa de homicídios (12/100 mil), enquanto estados como Bahia e Ceará ultrapassam 45/100 mil habitantes.

● Letalidade policial: Apesar da redução dos homicídios em geral, as mortes por intervenção policial aumentaram, refletindo uma abordagem de "mão dura".

● Crimes contra o patrimônio: Roubos e assaltos continuam elevados, embora com ligeira redução em 2024. O roubo de veículos e assaltos à mão armada são especialmente problemáticos no Rio de Janeiro e em São Paulo.

● Crime cibernético: Mais de 600 mil incidentes de crimes cibernéticos foram registrados apenas no primeiro semestre de 2024, um aumento de 15% em relação a 2023. A projeção é de crescimento de 40% até o final de 2024, com ataques de phishing, fraudes e ransomware como principais ameaças.


■ Crime organizado

● Principais organizações: O Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) controlam o tráfico de drogas, armas, pessoas, mineração ilegal e outras atividades ilícitas.

● Narcotráfico: O tráfico de drogas é responsável por cerca de 75% dos homicídios no país. O Brasil é um ponto estratégico no tráfico global de cocaína, especialmente em direção à Europa e África, utilizando portos como Manaus, Belém, Santos e Rio de Janeiro.

● Colaboração internacional: As facções brasileiras colaboram com cartéis mexicanos e máfias europeias no transporte de cocaína, aperfeiçoando métodos de ocultação em exportações legais.

■ Sistema penitenciário

O sistema penitenciário é um foco da criminalidade: o Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo, com um déficit de 174.436 vagas. As prisões são centros de recrutamento e coordenação de operações criminosas.

● Reformas: Tem-se tentado separar líderes criminosos da população geral e melhorar a segurança interna, mas os resultados têm sido limitados.


■ Respostas do Estado

● Militarização da segurança pública, especialmente no Rio de Janeiro, com atuação das Forças Armadas em favelas e áreas de conflito. A estratégia é criticada por seu caráter repressivo e pelo risco de violações de direitos humanos.

● Melhorias na integração e coordenação policial, especialmente em estados como São Paulo, onde o uso de tecnologia e a gestão eficiente têm reduzido a criminalidade.

● Desafios persistentes: a percepção de insegurança permanece alta, mesmo com a redução objetiva de alguns crimes. Segundo pesquisas recentes, a violência é o principal problema para 29% dos brasileiros — um número que triplicou desde dezembro de 2023.

■ Conclusões principais

O relatório destaca que o combate à criminalidade e à violência na América Latina exige mais do que respostas reativas ou mero aumento de recursos. Um dos pilares fundamentais para avanços sustentáveis é a profissionalização dos agentes de segurança pública. A capacitação contínua, formação ética e o desenvolvimento de competências técnicas especializadas são indispensáveis para que policiais, investigadores e agentes penitenciários consigam antecipar, prevenir e responder de forma eficaz às ameaças complexas do crime organizado.

A profissionalização não só aumenta a eficácia operacional, como também fortalece a legitimidade e a confiança da sociedade nas instituições de segurança. Um corpo de segurança profissionalizado é capaz de atuar com integridade, respeito aos direitos humanos e obediência à legalidade — fatores essenciais para reduzir a impunidade e restaurar o tecido social. Por isso, o relatório recomenda investir na formação integral dos agentes, promover a meritocracia e estabelecer mecanismos de avaliação e prestação de contas, como elementos-chave para transformar a segurança pública na região e enfrentar com êxito os desafios do presente e do futuro.

Por outro lado, o setor de segurança privada cresce a assume parte do papel que deveria ser do Estado. Para o setor, o novo Estatuto da Segurança Privada do Brasil, instituído pela Lei 14.967/2024, representa um avanço essencial para o setor ao substituir uma legislação ultrapassada, combater a atuação de empresas clandestinas — que superam em número as regulamentadas — e promover maior segurança jurídica e profissionalização. Entre os principais pontos estão o aumento do capital social exigido, a proibição da atuação de autônomos, o fortalecimento da fiscalização pela Polícia Federal e a valorização dos vigilantes por meio de qualificação obrigatória. A regulamentação do uso de tecnologias como monitoramento remoto e inteligência artificial também amplia a eficiência e a atuação do setor, especialmente em grandes centros urbanos. Destaca-se, ainda, a responsabilidade direta das empresas contratantes, que passam a ser legalmente responsabilizadas ao optarem por serviços de segurança não regulamentados, o que reforça a importância da conformidade legal e da ética na cadeia de prestação de serviços. Combinando qualificação, tecnologia e fiscalização rigorosa, o setor caminha para um futuro mais moderno, transparente e alinhado às demandas da sociedade.

● Problema complexo e sistêmico: A violência e a criminalidade na América Latina são fenômenos interligados, com fatores econômicos, sociais, políticos e culturais que se retroalimentam.

● Necessidade de medidas integradas: As respostas devem combinar desenvolvimento econômico, educação, diversificação produtiva e fortalecimento institucional — não apenas repressão policial.

● Políticas diferenciadas: É essencial adaptar as estratégias à tipologia e dinâmica dos grupos criminosos locais e transnacionais.

● Casos de sucesso locais: As experiências bem-sucedidas de redução da violência foram aquelas adaptadas às dinâmicas locais, com participação comunitária e enfoque multidimensional.

● Crescimento da segurança privada: A falta de capacidade estatal impulsionou o crescimento da segurança privada, que exige regulação e profissionalização.